O Garoto da Casa Verde VII

Quando se sente uma ligação forte consigo mesmo, quando algo te faz inspirar e respirar lentamente na sua vida, aquele momento o qual você consegue perceber a textura de seus dedos, a maciez da cadeira acolchoada nas suas pernas, a fina madeira do pincel em suas mãos, a sensação de estar de alguma forma teles portando a essência da sua alma, de seu braço para a ponta do pincel para a tela, a sensação que eu sentia ao ver a imagem da minha cabeça se formar em cores vivas diante dos meus olhos não tinha nada igual.
Eu nunca tinha pensado que em algum momento algo pudesse me deixar tão bem, que de alguma maneira pudesse me identificar, ainda estava pintando de aquarela, mas a alegria era grande.
O tempo que eu tinha para aprender as técnicas de pintura e praticar levava uma tarde inteira, porém era tão prazeroso que eu não sentia o tempo passar diante dos meus olhos, me sentia como um viciado em drogas, ou em bebidas que você chega ao ponto de se perguntar se conseguiria fazer outra coisa tão bem, com tanto capricho e esforço. Se eu pudesse passa o dia todo fazendo.
No meu quarto à noite, eu pegava um caderno de desenho, um pedaço fino de carvão e desenhava o Eduardo, tentava na minha memória buscar o máximo de traços possíveis, nos primeiros dias do feriado eu tinha uma dificuldade, por que as aulas e as técnicas ainda estavam no começo, mas a partir dos dias meu desenho foi ficando mais preciso, fui pedindo ajuda para o professor todos os dias, dicas e criticas que pudessem me ajudar aperfeiçoar.
Às vezes ele vinha me perguntar quem era a minha inspiração, ou melhor, qual é o meu modelo, mas eu sempre dizia que era da minha cabeça, que eu o simplesmente vi andando na rua e me deu uma vontade muito grande de desenhar.
Eu ficava horas obervando os movimentos às vezes rápidos e às vezes delicados, os movimentos que eu fazia com as mãos para ter a caracteriza e o tom que eu queria para aquela imagem, já fiquei tanto tempo desenhando, que esquecia as horas de refeição ou até mesmo quando a noite chegava e precisava ir dormir.
Eu era uma garota ingênua não fazia muita ideia das coisas ruins que poderiam acontecer comigo, eu tinha uma pequena ideia de que o mundo era pobre e que tinha muitas pessoas infelizes, que nem tudo na vida é perfeito, mas ninguém nunca tinha me feito algum mal, e a ideia romântica que tinha na cabeça com ele era a minha “única” realidade.
O meu primeiro contato com a realidade foi quando entrei naquele colégio na segunda feira, todo daquele colégio parecia já se conhecerem a muito tempo, parecia colégio dos filmes americanos, onde tinha vários armários nos corredores.
Entrei na primeira porta onde estava escrito diretoria e me sentei ao banco, esperando a minha vez para ser atendida, a final eu precisava pegar minhas matérias e meu cadeado do meu armário e os meus horários de aula.
Quando eu ouvi o meu nome da porta, eu vi uma garota loira dos olhos azuis, sair da sala do diretor, usava uma minissaia de líder de torcida, usava um decote branco e uma jaqueta preta, estava usando nos pés um enorme salto alto preto, assim que me levantei ela me olhou feio de baixo para cima de estudando, ela simplesmente olhou para mim com uma cara de nojo, estourou sua bola de chiclete e saiu desfilando pelo corredor.
Nesse momento foi que percebi que não estava mais no meu mudinho, que aquele mundo era completamente diferente, onde o que uma garota precisava fazer para se enturmar e chamar atenção era vestir e ser bonita com aquela que tinha passado por mim, mas esse era um dos problemas eu não sentia a necessidade de ser como aquela garota, gostava de como me vestia, simples e confortavelmente, estava vagando nos meus pensamentos quando ouvi me chamar pela segunda vez:

-Pode entrar Clara de Oliveira!
(Continuação)

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